Virtualização do corpo e sexualidades online: encontros gay, gênero e performatividade

Abstract

O objeto de investigação nessa pesquisa foi a performatividade de gênero e sexualidade e sua relação com os espaços virtuais tendo como base uma plataforma de gay dating. O encontro virtual gay é definido como uma atividade de sujeitos gays inseridos no universo digital contemporâneo que torna as sexualidades gays objetos de visibilidade dentro do ciberespaço para além das fronteiras nacionais. Ao conectar usuários gays mundo afora, essas páginas de encontro gay formam uma geografia global da sexualidade gay em termos de estratégias de sedução na busca por parceiros. Como estudo de caso para esta pesquisa, as sexualidades gays foram observadas em sua relação com o universo online dentro do site de encontros GayRomeo. Este recorte me permitiu analisar a conexão entre a teoria da performatividade e o uso das novas tecnologias, definindo as seguintes perguntas de pesquisa: 1) Que performances de gênero e sexualidade são afirmadas online na página de encontros GayRomeo? Como pode ser investigada a performatividade online? Em que medida é possível evitar o reducionismo construtivista? 2) Qual é a relação constitutiva dessas novas performatividades com processos de virtualização que ligam o espaço à sexualidade em uma concepção simétrica de agência entre atores humanos e não humanos? O trabalho de campo consistiu em observação participante da página com entrevistas semi-estruturadas com dezessete usuários do Brasil, Alemanha, México e Áustria. A análise dos dados das entrevistas consistiu em averiguar com os atores suas apropriações da plataforma e como essas apropriações articulavam as experiências sexuais online e offline dos usuários, assim com o objetivo de entender a base da diferença entre online e offline dating e o tipo de experiências de dating que os usuários informavam. A pesquisa demonstrou que as páginas virtuais de encontros gays são decididamente um novo espaço da nossa contemporaneidade em que a sexualidade entrelaça os domínios do público e do privado, borrando suas fronteiras. Há um arquivo queer tornando-se evidente precisamente com a misto de ordens normativas. O que o uso individual da página revelou, nesta pesquisa, é que distintos códigos e relações com a sexualidade aparecem na experiência diária dos usuários. Por um lado, usuários aderem a performances de gênero mais guiadas por um padrão heteronormativo, criando uma coerência entre identidade de gênero e sexualidade, que é refletida nos relatos de muitos quando eles apelam a figuras hegemônicas de masculinidade. Por outro lado, muitos usuários reportaram estratégias de desidentificação com a cultura gay mainstream, encarando uma não familiaridade com alguns aspectos da plataforma, como ter de definir um gênero. Esses aspectos contradizem uma perspectiva uniforme sobre a identidade gay. Isto é, uma “identidade gay global” não pode ser defendida se considerarmos o uso diário da página que indica múltiplas linhas de corporalidade e sexualidade.

The object of investigation in this research was the online performativity of gender and sexuality, and their relation to virtual spaces based on the analysis of a gay dating platform. Virtual gay dating is defined as an activity of gay subjects inserted in the contemporary digital universe, which turn gay sexualities in cyberspace into objects of visibility beyond national borders. Connecting gay users from around the world, these gay dating websites make up a global geography of gay sexuality in terms of strategies of seduction in the search for partners. As case study for this research, gay sexualities were observed in their relationship with the online universe within the gay dating webpage GayRomeo. This frame allowed me to analyze the connection between performativity theory and the use of new technologies, thus defining the research questions as following: 1) Which performances of gender and sexuality are affirmed in the GayRomeo online dating webpage? How can online performativity be investigated? In which extent is it possible to avoid constructivist reductionism? 2) Which is the constitutive relationship of these new performativities with virtualization processes that tie space to sexuality in a conception of symmetrical agency between human and nonhuman actors? This research was structured in: first, there was a theoretical discussion anticipating the fieldwork that consisted in constructing a genealogy of gender and sexuality categories with current contributions of investigations from the cultural and social sciences on sexuality, gender and technologies. All of these previous theories problematized an anthropocentric epistemology, assuming a type of agency that still focused greatly on a conscious and autonomous subject. The fieldwork consisted in a participant observation of the page together with semi-structured interviews with 17 gay users from Brazil, Germany, Mexico and Austria. Data analysis of the interviews consisted in checking with the actors their appropriations of the platform and how these appropriations articulated the users' online and offline sexual experiences, also aiming to understand the basis of the difference between offline and online dating and the kind of dating experiences users relayed. This research demonstrated that the online gay dating platforms are conclusively a new space of our contemporaneity in which sexuality entangled the public and private domains, blurring their boundaries. There was a queer archive becoming evident precisely with the mix of normative orders. What the individual use of the page revealed, in this investigation, is that distinct codes and relations with sexuality appeared in users' daily experiences. On the one hand, some users clung to gender performances more guided by a heteronormative pattern, creating coherence between gender identity and sexuality, which is reflected in the reports of many when they appealed to hegemonic figures of masculinity. On the other hand, many users reported strategies of (dis)identification with the mainstream gay culture, facing unfamiliarity with some aspects on the platform, such as having to define a gender. These aspects contradicted a uniform perspective on gay identity. That is, a "global gay identity" cannot be defended, by considering the daily use of the page that indicates multiple lines of corporeality and sexuality.